terça-feira, 23 de setembro de 2008

Os desafios da convergência de normas e o trabalho do CPC



Fonte: Revista contábil e empresarial

Data: 17/04/2008

Os desafios da convergência de normas e o trabalho do CPC

Esforço conjunto de entidades e reguladores já produz avanços, mas restam inúmeros desafios para a adequação às novas normas contábeis É tarde, é tarde, é tarde.” O bordão repetido exaustivamente pelo Coelho Branco, pesadelo da protagonista do livro Alice no País das Maravilhas, é o mesmo que nos últimos três meses vem atormentando personagens reais envolvidos com a pesada agenda de procedimentos, normas, estratégias e esclarecimentos necessários para cumprir até o final do ano as determinações impostas pela Lei 11.638. Depois de passar sete anos em banho-maria, o projeto que virou Lei no apagar das luzes do ano passado vai exigir de auditores, contadores, empresas e reguladores um alucinante ritmo de trabalho em 2008. A maratona implica a edição de instruções e regras em tempo recorde por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que precisou reduzir drasticamente o prazo para apreciação das propostas pelo mercado. No último dia 4, a autarquia encerrou o prazo para sugestões a uma minuta de Instrução Normativa de 11 páginas, divulgada em 20 de março, contendo orientações e normas para dez questões polêmicas e urgentes decorrentes da Lei 11.638. A CVM também se comprometeu a aprovar até o final do ano nada menos do que 15 determinações do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), que reúne representantes de todas as entidades envolvidas na confecção, análise e fiscalização de balanços. O cronograma do CPC para 2008 foi revisto também a toque de caixa. Alem de três pronunciamentos já aprovados e dos 15 previstos, um em audiência pública conjunta com a CVM e outro em fase de redação de minuta, há outros três já em análise pelo Comitê.
O Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon), por sua vez, corre para traduzir o livro que reúne todos os International Financial Reporting Standards (IFRS). A Lei não obriga a adesão total aos IFRS por parte das empresas brasileiras até o final do ano, mas o conhecimento do manual é fundamental para compreender as novas regras que entram em vigor neste exercício. Enquanto isso, consultorias, escolas de administração, especialistas e firmas de auditoria promovem inúmeros seminários, debates, cursos, palestras, apostilas e até livros sobre o espinhoso tema. E a auditoria Ernst & Young correu para concluir este mês um estudo comparativo entre os IFRS e as regras de contabilidade normalmente aceitas no Brasil, conhecidas como BR GAAP.
Mercado de capitais
Mas não é só. “Contabilidade não é um assunto meramente técnico, é questão de governança corporativa. Tem impacto direto nos custos das empresas e na imagem do País”, lembra Henri Fortin, gerente de projetos do Banco Mundial, responsável pelo Relatório Rosc, um estudo sobre o cumprimento das normas e códigos de contabilidade e auditoria no Brasil que inspirou a alteração de ao menos uma dúzia de conceitos BR GAAP pela Lei 11.638. “A adoção de padrões internacionais diminuirá custos na medida em que tornará os demonstrativos mais transparentes e confiáveis”, reforça Roberto Teixeira da Costa, que foi o primeiro presidente da CVM e membro do conselho da Iasc, fundação que criou o Comitê de Normas Internacionais de Contabilidade (Iasb). “A contabilidade é a linguagem dos negócios”, completa Guy de Almeida Andrade, sócio da auditoria Magalhães Andrade, membro do comitê de auditoria do Unibanco e do comitê de nomeações da Federação Internacional de Contadores (Ifac).
Para os entrevistados, quanto mais inteligível e comparável forem os balanços das empresas brasileiras, mais atrairão a confiança – e o dinheiro – dos investidores internacionais. Adotar o padrão internacional pode, portanto, ajudar o Brasil num momento de crise internacional, em que cresce a aversão ao risco. Da mesma forma, contribui para que o País alcance o tão almejado grau de investimento, acredita Andrade. Para completar, ajuda a reduzir custos de abertura de capital também no mercado doméstico, acrescenta Gabriel Jorge Ferreira, presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF).
“A aprovação da Lei foi o primeiro passo para aproximar as demonstrações locais ao padrão internacional aos IFRS”, reconheceu Fortin, ao apresentar o relatório Rosc durante um seminário realizado no final de março em São Paulo. O Banco Mundial pretende agora fazer uma revisão do diagnóstico, à luz da nova Lei e de sugestões do mercado, para então elaborar um plano de ação para a convergência das normas contábeis brasileiras aos IFRS. Segundo Fortin, o plano terá a supervisão do Ministério da Fazenda e a assistência do Banco Mundial. “Ainda há muito trabalho a ser feito antes que todas as empresas brasileiras possam adotar integralmente os IFRS”, diz Fortin.
Andrade concorda. Para ele, o relatório Rosc traz recomendações importantes que ainda nem começaram a ser discutidas, como por exemplo a criação de uma entidade pública (com participação de representantes do mercado, como jornalistas, políticos e empresários, e não apenas contadores e auditores) para supervisionar o sistema de revisão pelos pares. A revisão já é uma prática adotada no Brasil, para garantir a qualidade das auditorias dos balanços. Aqui, porém, a supervisão e feita pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), que não tem poder para cassar registro nem aplicar sanções, ao contrário do que ocorre no exterior. Para Teixeira da Costa, o próximo desafio será exatamente este: garantir que os balanços brasileiros, quando convertidos para IFRS, sejam realmente fiéis ao padrão – o que se consegue apenas com auditoria de boa qualidade.
Moinhos de vento
O economista, que hoje faz parte dos conselhos da Sul América e da Brasilpar Serviços Financeiros, disse que nos sete anos que esteve à frente da Iasc (entre 2000 e 2007) sentiu-se como verdadeiro Dom Quixote, personagem de Cervantes: um idealista que lutava contra moinhos de vento. “No começo a idéia de adotar regras universais de balanços era questionada até pelos países desenvolvidos”, lembra. “O ser humano é por natureza resistente a mudanças.” Andrade acrescenta: “A convergência a padrões internacionais não é simples, envolve crenças”. Na verdade, ele entende que o caminho escolhido no Brasil não é o da convergência nem da harmonização, mas da adoção dos IFRS. Uma adoção à brasileira, é verdade – diferente da proposta para as regras de auditoria, que serão simplesmente traduzidas e encampadas, pois não há conflitos evidentes nem polêmicas a superar, explica. “Mas é preciso ser fiel aos princípios que regem as regras internacionais mesmo quando o assunto for peculiar à realidade brasileira, como a contabilização de consórcios – modalidade que não existe no exterior”, defende.
O padrão IFRS já foi adotado por mais de cem países, mas os entrevistados prevêem ainda novas batalhas no front brasileiro. Uma das questões mais polêmicas diz respeito à regra para avaliação dos ativos – assunto que não encontra consenso nem mesmo entre especialistas internacionais. “O padrão IFRS baseia-se em princípios e não em regras, como o norte-americano”, lembra Teixeira da Costa. A maioria dos especialistas concorda com sua visão: para ele, apesar dessa orientação ser melhor do ponto de vista filosófico, por outro lado abre muita margem a interpretações e julgamentos de valor. Não é à toa que a preocupação com a formação e a ética dos contadores e auditores nesse novo ambiente é fundamental.
Pequenas empresas
A nova Lei estendeu a obrigação de auditar balanços a empresas fechadas com receita total acima de R$ 300 milhões por ano, ou patrimônio líquido acima de R$ 240 milhões – antes, apenas as empresas abertas eram obrigadas, o que deixava de fora inúmeras filiais de multinacionais de capital fechado que, dessa forma, ganhavam vantagem sobre as concorrentes locais sujeitas a auditar e publicar seus resultados. “Este foi um dos principais avanços da nova Lei”, diz Andrade. Para ele, as melhores práticas de contabilidade não criam problemas, apenas “tiram a cortina, revelam a realidade dos fatos”, garante. Além disso, a CVM já havia determinado adesão integral aos IFRS por parte das companhias abertas até 2010 – o Banco Central fez o mesmo com as instituições financeiras. “Resta agora uma definição de regras para induzir a adoção das melhores práticas de contabilidade pelas pequenas e médias empresas brasileiras, que são a maioria no País”, destaca Fortin, do Banco Mundial.
Teixeira da Costa também crê que essa seja uma outra grande dificuldade pela frente. Para ele, a transição deve ser gradual. Gabriel Jorge Ferreira, que além de presidir a CNF faz parte do Conselho do Unibanco, garante que embora complexa, a adoção de regras internacionais de contabilidade favoreceria muito as pequenas empresas, que poderiam tomar empréstimos bancários a juros mais baixos. “Avanços na qualidade dos controles e informações, bem como a contratação de auditorias, melhoraria a analise de riscos dessas empresas”, diz, lembrando que os bancos cobram juros pelo risco desconhecido. Ferreira acredita que melhores balanços abririam a essas empresas um leque de alternativas de captação de recursos para investir e crescer – até mesmo permitindo sua participação em concorrências públicas e em parcerias com grandes empresas em grandes projetos. “As pequenas empresas são as que mais precisam de crédito. Ainda que sejam obrigadas a cumprir regras menos rígidas, como a simples mudança de regime de caixa para regime de competência e a contratação de auditoria, o ganho já seria notável”, acredita. “Em um ambiente obscuro, parte do risco é incorporado às taxas de juros”, ilustra Andrade.
Wagner de Aquino, da Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria da CVM, concorda। “Quanto mais as empresas divulgarem informações confiáveis e compreensíveis, mais confiança terão dos investidores e credores. Quanto menor o risco, menor o preço cobrado, e mais justo será o valor pago, seja por empréstimos seja por capital”, acrescenta. Além da incorporação das pequenas empresas ao processo de convergência, Aquino defende ainda um grande esforço educacional como fundamental para o sucesso do projeto. “A concentração do conhecimento do assunto reduz o acesso às informações, que são muito complexas”, afirma.

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Opinião:
A opinião do autor em descrever os desafios para implantação e mudanças na contabilidade tem levado não só autor pensar como todos os profissionais e afins, pois é um assunto de grande importância que trará benefícios e investimentos ao nosso país

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